terça-feira, 17 de novembro de 2009

Sabine

Estou com medo, Sabine. Eu sei, eu sei que você já disse que eu sou a última pessoa no mundo que preciso sentir medo. Que, na verdade, eu sou a única que não preciso. Sei o quanto tenho sorte por ter você comigo e do trato que fizemos em sonho, antes do nosso primeiro encontro, em que você prometeu me proteger de todos os perigos do mundo se eu a deixasse viver na minha cabeça. Eu também acho que juntas somos imbatíveis, E você tinha que ser minha, eu já sabia. Naquela tarde, no parque de Steglitz, quando mamãe me deixou sozinha por um instante enquanto pegava a cesta de piquenique, eu vi você no colo daquela garotinha. Você é com certeza a tradução da beleza perfeita: seu rosto alvíssimo, seus lábios de coração, seu vestido de seda púrpura e o chapéu com laço todo em renda... Seus olhos são tão lindos, tão diferentes das outras bonecas, porque se pode ver como enxergam de verdade, observam mesmo, tudo ao redor. E os cabelos! Cachos com o brilho e a cor do fogo... Você tinha que ser minha, Sabine. Até o seu nome eu já sabia, e pude confirmar quando vi a pequena marca em forma de S, assim, como uma cobrinha na sua bochecha esquerda. Parecia uma cicatriz, o que no começo me pareceu muito estranho, porque eu não pensava que bonecas podiam se machucar de verdade. Eu identifiquei o S no seu rosto, sabe, porque eu já sei ler quase todas as letras. Ao contrário daquela garotinha tola de Steglitz, que ficou chorando como um bebê quando deu falta de você. Aposto que ela não agüenta ficar sozinha e vive pedindo colo. Ela não merecia você, por certo que não. Você tem cumprido direitinho sua promessa. Dormimos juntas há várias noites, e desde então eu nunca, nunca mais vi aquele fantasma. E além de me livrar dele, você ainda cuida de mim em meus sonhos, e resolve tudo pra mim. Posso dizer que fiquei contente quando você soprou aquela flor na minha garganta, e quando eu acordei e tive febre, mamãe resolveu ficar em casa comigo. Eu estava achando mesmo que ela tem passado muito pouco tempo em casa, e isto não é nada bom. Também naquela noite em que você e eu comemos todo o bolo de aniversário do Oliver, e lambemos a cobertura, sem precisar cortar as fatias e nem usar guardanapo, eu pensei que podia ficar morando com você para sempre, na minha cabeça. Não queria voltar e ter que brincar com Oliver, e dar os parabéns a ele pelo aniversário, e mostrar à mamãe e ao tio Theodor que sou bem educada. A realidade é que eu estava tão furiosa por ele ter estragado todo o meu canteiro de flores mágicas com aquele trem estúpido, que não fiquei nem um pouquinho preocupada quando você soprou o feitiço nas costas dele. Mas depois, Sabine, quando eu acordei, Oliver tinha quebrado o pé tentando descer do beliche. Parece que foi feio mesmo, porque o osso dele ficou aparecendo e saía muito sangue, e agora ele está tendo febre e enjôos por causa da infecção. O doutor não sabe se vai precisar cortar o pé de Oliver para o machucado não comer o resto da perna dele.É por isso, Sabine, que eu queria lhe pedir: me faça acordar logo, porque eu estou com medo que aconteça alguma coisa ruim. Você disse que sempre que eu quisesse acordar, bastava eu chamar você. Quando eu fico acordada, você fica dormindo, e não pode se mexer e nem falar. Sei que você não gosta disso e prefere estar na minha cabeça, onde fazemos tudo juntas, mas agora já faz um tempo que estou sonhando e acho que podem estar sentindo a minha falta. Será que você poderia, por favor, me deixar voltar? ...Sabine?

Um comentário:

miss_lioncourt disse...

gabi tenho coisas pra te dizer, olha meu blog