quarta-feira, 3 de março de 2010

o menino sulfuroso

  • Conheçam o menino sulfuroso
  • que vem abrindo vales com os calcanhares
  • que refazem cem vezes o mesmo caminho
  • para diferentes lugares
  • Seu espírito a se derramar
  • corrosivo sobre as criaturas
  • que insistem em existir
  • decompondo-as em mínimas partes
  • destituindo-as de importância
  • reduzindo-as a ruínas
  • corrompendo-lhes a lógica
  • e dissolvendo-lhes o verniz da aparência
  • O menino sulfuroso, quando destrói, se ilumina
  • de desespero
  • e de gozo
  • Escoa a dor que, calada, lhe consome os nervos
  • e espirra no mundo a fúria que lhe estrangula
  • o deslocado coração maior que o peito
  • Anda com pressa de não chegar ao fim
  • com passos largos de desdém pela estrada
  • com dentes de arrancar raízes e uma âncora na cabeça
  • O menino sulfuroso anda só
  • com uma incurável saudade de si mesmo
  • com sal nos olhos e punhos em guarda
  • retesando os músculos que lhe sustentam os sonhos
  • e despistando a lava que lhe inflama a alma
  • É sabido, todavia, que no escuro mais silencioso dos olhos
  • ele cria céus de aurora boreal e violetas
  • monta notas musicais
  • e ainda cavalga esperanças de aço.
  • -Deixa eu ver essas unhas, dá aqui!
  • -Não...
  • -Anda, criança! Deixa de ser idiota!... Hum... Mas que imundície... Hahahahah! Tem um porquinho aqui!... Me faz o favor, tá? Não vai querer parecer uma sujeira ambulante. Preciso falar de novo?
  • -Não.
  • A lágrima pesada, rola insolente pelo rosto duro e diminuto. A mão suja esfrega e seca. A passos decididos, anda na direção do lavabo, esmigalhando os tocos de giz de cera e o desenho no chão. Um pé arrasta parte da folha, rasgando a montanha. O sol, amarrotado, por de trás, sorri torto para a árvore solitária, azul piscina.