segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

quase outro

Estou. Nada me é conhecido, apenas sinto a presença do mundo. Não ao meu redor, pois não conheço os meus limites para definir o entorno, mas a presença do mundo em mim. O número de possibilidades para o que irei me tornar é infinito, mas o infinito é deveras imenso para ser pensado, além do que ainda não sei o que é pensar. Consigo diferenciar pequenas variações de ritmo e freqüência de um palpitar, e algo frio que me percorre e depois me abandona. Um dia aprenderei que isto são meus batimentos cardíacos e o ar que circula por meus pulmões. As vezes é dolorido, e então, quando cessa a dor, é agradável. Começo um exercício de controle para poder experimentar de novo a sensação.
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É um calor e uma umidade que se misturam com algo mais, não sei dizer. Parece com quando inspiro o ar, mas tem uma consistência diferente, e parece também ser uma área diferente que me afeta.
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Estou me alimentando, e o líquido que chega ao meu estômago me aquece e conforta, ao mesmo tempo em que agonizo com a quantidade excessiva que as vezes me faz engasgar. Quando a agonia cessa, tenho alívio. Mas dessa vez foi um pouco melhor do que alívio, pois suportei uma aflição por segundos a mais, e então, quando pude livrar-me dela, foi bom. Foi bom... Vou tentar repetir isto, mas farei com que seja ainda mais prazeroso. Quanto mais tempo espero para descarregar essa intensidade, mais prazer tenho na descarga, seja lá o que for isto... Eis minha razão de viver. Dá um pouco de trabalho, mas acho que vale a pena.
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Entretanto, esta manhã estive tentando fazer aquilo de novo, mas por algum motivo não funcionou. Suportei a fome por tanto tempo que, quando finalmente fiz surgir o alimento, já estava sem vontade. Na verdade não queria ingerir isto agora, por que está aqui em minha boca? Fecho-me e faço tudo desaparecer. Contraio a mandíbula, contraio-me tanto quanto posso, mas continua lá, fora da hora do meu desejo. É algo que posso sentir em minha pele, algo que posso inalar, ver, escutar. Começo a desconfiar de algo terrível e realmente assustador...
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Eu sou certeza, nunca sou dúvida. Mesmo sem saber o que significam tais conceitos. Sou assim porque nada me falta. Mas aquela desconfiança... É como uma coceira. É uma quase percepção - quase, porque já a tive, mas não completamente, e ela me assombra de tal forma que prefiro pensar que não a tive: Haverá algo aqui que não esteja sob meu domínio? Alguma força que não se produza pela minha vontade e ação espontânea? Haverá em mim, que sou o próprio universo, algo que seja um não-eu, um... Outro?

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